São Paulo - Acabo de descobrir mais um desses absurdos que
só servem para atrasar a vida das pessoas que tocam este país: investir em
educação é contra a lei. Vocês não acreditam? Minha empresa, a Geremia, tem 25
anos e fabrica equipamentos para extração de petróleo, um ramo que exige
tecnologia de ponta e muita
Disputamos cada pedacinho do mercado com países fortes, como
os Estados Unidos e o Canadá. Só dá para ser competitivo se eu tiver pessoas
qualificadas trabalhando comigo. Com essa preocupação criei, em 1988, um
programa que custeia a educação em todos os níveis para qualquer funcionário,
seja ele um varredor ou um técnico.
Este ano um fiscal do INSS visitou a empresa e entendeu que
educação é salário indireto. Exigiu o recolhimento da contribuição social sobre
os valores que pagamos aos estabelecimentos de ensino freqüentados por nossos
funcionários, acrescidos de juros de mora e multa pelo não recolhimento ao
INSS.
Tenho que pagar 26 000 reais à Previdência por promover a
educação dos meus funcionários? Eu acho que não. Por isso recorri à Justiça.
Não é pelo valor, é porque acho essa tributação um atentado. Estou revoltado.
Vou continuar não recolhendo um centavo ao INSS, mesmo que eu seja multado 1
000 vezes.
O Estado brasileiro está falido. Mais da metade das crianças
que iniciam a 1a série não conclui o ciclo básico. A Constituição diz que
educação é direito do cidadão e dever do Estado. E quem é o Estado? Somos todos
nós. Se a União não tem recursos e eu tenho, eu acho que devo pagar a escola
dos meus funcionários.
Tudo bem, não estou cobrando nada do Estado. Mas também não
aceito que o Estado me penalize por fazer o que ele não faz. Se a moda pega,
empresas que proporcionam cada vez mais benefícios vão recuar.
Não temos mais tempo a perder. As leis retrógradas,
ultrapassadas e em total descompasso com a realidade devem ser revogadas. A
legislação e a mentalidade dos nossos homens públicos devem adequar-se aos
novos tempos.
Por favor, deixem quem está fazendo alguma coisa trabalhar
em paz. Vão cobrar de quem desvia dinheiro, de quem sonega impostos, de quem
rouba a Previdência, de quem contrata mão-de-obra fria, sem registro algum.
Sou filho de família pobre, de pequenos agricultores, e não
tive muito estudo. Completei o 1o grau aos 22 anos e, com dinheiro ganho no meu
primeiro emprego, numa indústria de Bento Gonçalves, na serra gaúcha, paguei
uma escola técnica de eletromecânica. Cheguei a fazer vestibular e entrar na
faculdade, mas nunca terminei o curso de Engenharia Mecânica por falta de
tempo.
Eu precisava fazer minha empresa crescer. Até hoje me
emociono quando vejo alguém se formar. Quis fazer com meus empregados o que
gostaria que tivessem feito comigo. A cada ano cresce o valor que invisto em
educação porque muitos funcionários já estão chegando à Universidade.
O fiscal do INSS acredita que estou sujeito a ações
judiciais. Segundo ele, algum empregado que não receba os valores para educação
poderá reclamar uma equiparação salarial com o colega que recebe. Nunca, desde
que existe o programa, um funcionário meu entrou na Justiça.
Todos sabem que estudar é uma opção daqueles que têm vontade
de crescer. E quem tem esse sonho pode realizá-lo porque a empresa oferece essa
oportunidade. O empregado pode estudar o que quiser, mesmo que seja Filosofia,
que não teria qualquer aproveitamento prático na Geremia. No mínimo, ele
trabalhará mais feliz.
Meu sonho de consumo sempre foi uma Mercedes-Benz. Adiei sua
realização várias vezes porque, como cidadão consciente do meu dever social,
quis usar meu dinheiro para fazer alguma coisa pelos meus 280 empregados.
Com os valores que gastei no ano passado na educação deles,
eu poderia ter comprado duas Mercedes. Teria mandado dinheiro para fora do país
e não estaria me incomodando com leis absurdas. Mas não consigo fazer isso. Sou
um teimoso.
No momento em que o modelo de Estado que faz tudo está sendo
questionado, cabe uma outra pergunta. Quem vai fazer no seu lugar? Até agora,
tem sido a iniciativa privada. Não conheço, felizmente, muitas empresas que
tenham recebido o tratamento que a Geremia recebeu da Previdência por fazer o
que é dever do Estado.
As que foram punidas preferiram se calar e, simplesmente,
abandonar seus programas educacionais. Com esse alerta temo desestimular os que
ainda não pagam os estudos de seus funcionários. Não é o meu objetivo.
Eu, pelo menos, continuarei ousando ser empresário, a
despeito de eventuais crises, e não vou parar de investir no meu patrimônio
mais precioso: as pessoas. Eu sou mesmo teimoso.
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